quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Lira do encanto


Quando tu choras, eu me entristeço

Aperta o peito ao ouvir teu pranto

Tudo o que é belo perde o encanto

E nessa aflição eu me desconheço.

 
As lágrimas que vertem da tua face

Como uma nascente de água pura

Orvalham meus olhos de amargura

Que não camufla nem com disfarce.

 
Quando sorris, o sol brilha reluzente

Os jardins se tornam multicoloridos

Os pássaros chilreiam mais atrevidos

E a minh’alma desperta alegremente.

 
Dos teus lábios emana toda simpatia

De onde nasce a fonte que me inspira

Ao extrair do fundo do coração a lira

Que eu canto dia e noite, noite e dia.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Entre a Língua e a Gramática



Uma das maiores riquezas de nosso país é, sem dúvida, a diversidade cultural. De norte a sul desse imenso território, é possível perceber a grandeza das mais diversas formas de representação da cultura regional. Em meio a tudo isso, no entanto, cresceu um mito paradoxal: a ilusão de que o Brasil é um país de unidade lingüística.

Esse mito é o responsável pela ideia de que se todos falamos uma mesma língua, essa deve ser padrão para todos e se basear em uma única gramática. Esse purismo despreza as variantes lingüísticas, responsáveis pelas diversos falares, sotaques e dialetos regionais e sociais. Apesar de a base ser a língua portuguesa, há que reconhecer que ela se transforma em cada cultura e que isso é importante para a sua evolução.

No entanto, muitos não reconhecem essa diversidade. Recentemente, a grande mídia fez um alarde em torno do conteúdo de um livro adotado pelo Ministério da Educação para o ensino de língua portuguesa nas escolas. O livro, ao tratar do assunto da variante lingüística, mencionava algumas formas da linguagem no Brasil. O livro foi condenado por quem não conhece do assunto e por aqueles que não leram o livro e não gostaram.

Vale lembrar inicialmente que a língua portuguesa é um idioma que se deriva do língua latina, mas não do latim culto falado em Roma, mas do latim vulgar falado pela plebe e pelos soldados.  Logo, é uma variação de outra língua que já se apresentava com variações próprias. Assim, várias palavras e expressões sofreram constantes modificações e verbetes provenientes de distintos idiomas dos povos que ocuparam a península ibérica.

Por conta disso, é temerário considerar erro o desvio da norma culta, da língua padrão. O mais correto deveria considerá-los variantes lingüísticas. Como parte do acervo cultural, a língua de um povo é viva e em constante mutação, dependendo da geração, do lugar e das condições A contribuição da Linguística nesse sentido tem ajudado a dar um aporte científico a esse incipiente debate nos últimos anos.

O mais interessante é essa crítica à gramática tradicional não é novidade das duas últimas décadas. A defesa de um português genuinamente brasileira era uma das bandeiras do movimento Modernista. Daí resulta, a título de exemplo, a famosa e magnífica crítica de Oswald de Andrade ao formalismo lingüístico no poema Pronominais:

Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro.

Logo, querer submeter essa diversidade lingüística ao rígido controle de uma gramática muitas vezes limitada ao falar do Rio de Janeiro do início do século XX é um equívoco que a sociedade ainda não percebeu.  E como disse Luís Fernando Veríssimo jocosamente : “A gramática precisa apanhar todos os dias para saber quem é que manda”.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Lua


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Ó lua, que no meio do céu fulgura

Sublime e bela em sua plenitude

À noite traz o silêncio da quietude

Que precede a ópera da amargura


Cúmplice dos casais apaixonados

Dos amores proibidos alcoviteira

É por ela que velo a noite inteira

Em busca dos sonhos embrulhados


A brisa que tens como mensageira

Cochicha em meus ouvidos a verdade

-Para quê sofrer com tanta saudade?


Ó lua que brilha no céu altaneira

Dissipa de mim a angústia de outrora

Me faz sonhar com uma nova aurora.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

A nostalgia e o tempo


Impressiona-me como algumas músicas do passado nos despertam nostalgia. De repente, somos transportados no tempo para reviver uma época remota de nossa vida. Ao analisar a nossa trajetória, temos a impressão de que a nossa vida - como numa produção épica -  é feita de episódios com um protagonista vivido por vários atores. Além das condições da época, o tempo é o principal agente dessa transformação.

Nessa retrospectiva interna, percebemos que muito dos desafios da época foram alcançados, outros esquecidos ao longo do tempo ou simplesmente substituídos pela realidade. O desejo de voltar no tempo e refazer ou tomar outras decisões sempre foi a grande aspiração humana e, por razões óbvias, vencer as barreiras que o tempo nos impõe tem sido a maior limitação.

O Deus Cronos controlava o tempo na mitologia grega. Zeus, seu filho,  ao destroná-lo e acorrentá-lo conseguiu controlar o tempo, conferindo a imortalidade aos deuses. Cronos era representado como um ancião empunhando uma foice e frequentemente aparecia associado a divindades estrangeiras propensas a sacrifícios humanos. Daí a noção de imortalidade associada ao tempo, que deixou de ser exclusividade dos helênicos e alcançou a cultura mundial.

A nossa impotência em relação ao tempo passado é a fiadora de nossas frustrações, principalmente aquelas em que deveríamos fazer algo e não fizemos, a pior de todas, na minha avaliação. Nessa lista se encontram ainda as omissões, as oportunidades desperdiçadas, as mulheres não amadas. Em outras circunstâncias, vivemos um momento do passado como se fosse sempre melhor que o presente.

Já o tempo futuro carrega em si o mistério, limitado pela eterna hipótese existencial de cada um. Lord Byron dizia que o melhor profeta do futuro é o passado. A frase do poeta inglês do romantismo aparentemente nos traz a ferramenta necessária para entender o nosso destino, no entanto não é suficiente para nos livrar da eterna dúvida acerca do futuro, até mesmo porque, para nós, temos a esperança de que o futuro será sempre melhor que o passado.

Assim, podemos perceber que uns se alimentam com as glórias do passado; outros vivem a  acalentar o sonho de um futuro. Todavia, poucos são os que enxergam a beleza do presente.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

O novo tempo


Eis que anunciada a passagem do velho tempo

Sem exéquias  e sem as  viúvas em pranto

O clarinete entoa os acordes do mesmo canto

Réquiem que faz coro ao barulho do vento

No ataúde jaz o tormento de uma era

De trevas,  de afronta ao conhecimento

Que agora será objeto de esquecimento

E  que há muito tempo já apodrecera



Celebremos, pois, o novo como quimera

Que há de alcançar os polos dessa esfera

E a luz dos saber resplandece com maestria



afastando-nos das armadilhas do senso comum

e da  a trilha soberba que leva a lugar nenhum

rompendo pela a estreita vereda  da sabedoria.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

No Jardim



A bela flor – que emana os mais doces perfumes
E enfeita o jardim com suas  pétalas bem formosas

Num dia de irresignação, bradou com muito ciúmes:

-Eu quero ser a borboleta que voa livre  e graciosa!

E a borboleta rondando o jardim e exibindo mil cores

Batia suas asas sob o olhar encantado de toda a cidade
E na ânsia perpétua de poder visitar todas as flores

Invejava no beija-flor o tamanho e a agilidade.

Com suas peripécias, o beija-flor seguia sua função

De polinizar em todo o jardim a paz e a harmonia
Mas viu que o néctar não lhe trazia a mesma emoção

Sentida pela moça que – apaixonada- a flor sorvia

E a moça – cuja pele era tão lisa como uma rosa

Procurava errante, no jardim, como amenizar a sua dor
E diante da dor de uma grande desilusão amorosa

Desejava ter apenas a placidez e beleza de uma flor.
(Osmar Aguiar)

domingo, 10 de junho de 2012

A mensagem dos Ipês



Em meio ao cerrado forte e vigoroso
Uma mensagem logo se anuncia
Quando flora o ipê roxo e frondoso
É a secura que na cidade principia.



Como Vivaldi traduz os sons da primavera
O Ipê roxo é o Allegro no nosso Inverno
Que tão belo e colorido deveras
Por que não ser também eterno?



O concreto de Niemeyer fica desarmado
Ante a arquitetura dos roxos buquês
Que colorem a flora do cerrado
Na mensagem efêmera dos ipês.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Reflexões sobre a educação


É comum ouvirmos que a educação deve ser prioridade de uma nação em desenvolvimento.  Isso é dito por políticos, jornalistas,  apresentadores de rádio e TV, articulistas de jornais, blogueiros de plantão, além de diversos profissionais liberais. A sentença é praticamente uma verdade geral. De igual modo, quanto se fala dos problemas em educação, a preocupação unânime gira em torno da falta de recursos ou de prioridade no financiamento da educação por parte dos governantes. 

Tudo isso não deixa de ser relevante, mas o que me preocupa não é só isso. Quiçá, o principal dilema hoje em relação ao assunto, para mim, é a forma como é feita a educação nas salas de aula, o que me permite afirmar com todas as letras e com honrosas exceções, que o único ofício que insiste em não evoluir, nesses 500 e poucos anos de história, é a nossa forma de ministrar as  aulas. Ou seja, fazemos hoje que os jesuítas faziam quando chegaram ao Brasil no Séc. XVI.

E isso é de fácil constatação, a começar pela organização da sala de aula, em que as cadeiras dos alunos ficam enfileiradas  e o professor no centro de tudo, transmitindo o conteúdo aos alunos. Estes têm apenas a responsabilidade de entender a visão passada pelo professor e resolver exercícios e provas com base nisso, para, assim, obterem a aprovação.  Pouco espaço para o debate e para a construção e transformação do conhecimento. Se um aluno questiona o entendimento do professor, logo é considerado um sujeito que “quer aparecer”. Quer forma mais arcaica de compreender o ato de ensino-aprendizagem? 

Diversos são os teóricos, desde o Renascimento, que condenam essa forma de educação, herdada certamente do obscurantismo da Idade Média. Michel de Motaigne foi um desses questionadores.  Ele partia do pressuposto de que o conhecimento objetiva a formação de um homem ou mulher completos. O alvo de sua crítica era essa forma de ensinar meramente expositiva, centrada professor e na passagem do conteúdo a todo custo. Para ele, é preciso educar o juízo do aluno, em vez de encher-lhe a cabeça com palavras. Uma visão muito próxima do que os modernos educadores pregam para a o ensino.  Paulo Freire criticou a forma tradicional de educação, denominando-a educação bancária, preocupada em depositar o “conhecimento de quem sabe” no “vazio de quem não sabe”. 

Para isso, mais do que nunca, vejo que o objetivo do professor é abrir o caminho para a leitura do aluno acerca do objeto do conhecimento e não dizer-lhe a forma como deve  conhecer.  Vejo que a preocupação dos verdadeiros mestres é com a substância e não apenas se entendeu as palavras que usou naquela lição. Assim, os alunos deixam de ser objetos e passam a ser sujeitos do processo de ensino-aprendizagem,  o que gera cidadãos mais críticos e, por conseguinte, menos submissos.

Portanto, para a compreensão dos verdadeiros objetivos da educação, a metáfora da abelha me parece a figura mais oportuna para explica-los. O mel produzido pelas abelhas não é o resultado da mistura do néctar que elas sorvem de várias flores, mas de um processo de transformação no interior de seu organismo.  Se elas simplesmente misturassem os néctares, não teríamos mel.  Assim é o conhecimento: não basta pegar as várias informações e juntá-las, é preciso interpretá-las com base em nossa visão de mundo e no contexto. Educação é isso. O resto é mera transmissão de informações.